18/11/2025
Em atenção ao que vem sendo consultado por diversos clientes, seguem as primeiras considerações do escritório sobre a deliberação de lucros em face da iminente aprovação do PL nº 1.087/2025.
1. Contexto: exigência de deliberação até 31/12/2025
O PL nº 1.087/2025 condiciona a manutenção da isenção dos lucros apurados até 31/12/2025 à aprovação formal da sua distribuição até essa mesma data, com definição prévia de exigibilidade e cronograma de pagamento.
Na prática, isso entra em choque com o rito contábil regular: o lucro do exercício de 2025 só se consolida após o encerramento e aprovação das demonstrações financeiras, o que, em condições normais, ocorre apenas em 2026, depois de considerados eventos subsequentes, provisões e eventual auditoria.
Essa incompatibilidade entre calendário legislativo e técnica contábil foi expressamente apontada pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC), em Nota Técnica que encaminhou ao Congresso (doc. anexo).
2. Posição do CFC e pedidos de veto
Na Nota Técnica, o CFC destaca que não é tecnicamente possível exigir, em dezembro, deliberação societária sobre um lucro ainda não encerrado. A crítica se concentra em especial nas seguintes previsões do PL:
• Art. 16 A, § 1º, inciso XII, alínea “b”
condiciona a isenção à distribuição aprovada até 31 de dezembro de 2025 pelo órgão societário competente;
• Art. 16 A, § 1º, inciso XII, alínea “c”
vincula a isenção ao fato de que o pagamento, crédito ou entrega ao sócio ocorra entre 2026 e 2028, de acordo com termos aprovados até 31 de dezembro de 2025.
O CFC propõe o veto desses dispositivos por entender que:
• criam condição indevida e tecnicamente inviável, ao exigir deliberação até 31/12/2025 sobre lucro ainda sujeito à apuração final;
• reforçam uma lógica de aprovação societária antecipada que é incompatível com o processo contábil regular;
• rompem a coerência normativa, pois a exclusão da tributação deve vincular-se à data de apuração do resultado (alínea “a”), e não a um calendário artificial.
Até o momento, o PL ainda não foi enviado à sanção presidencial, e não há garantia de que os vetos sugeridos serão acolhidos. A pressão técnica existe, mas pode ou não surtir efeito prático.
Por isso, trabalhamos hoje com o cenário mais conservador: considerar que o texto será aprovado tal como está ou com alterações apenas parciais, exigindo alguma forma de deliberação ainda em 2025.
3. Modelos de deliberação societária que vêm sendo adotados
Diante dessa realidade, as empresas têm buscado estruturar deliberações em 2025 que sejam, ao mesmo tempo, juridicamente defensáveis e tecnicamente coerentes com a contabilidade. A seguir, apresentamos três modelos possíveis, com nova denominação e breve qualificação:
(lucro líquido já apurado em balancete até 11/2025)
Deliberação com base em lucros líquidos e disponíveis indicados em balancete intermediário confiável (por exemplo, em 30/11/2025), já ajustado por provisões relevantes e, quando for o caso, revisado pela auditoria.
• O valor é individualizado por sócio.
• Fixa se um cronograma de pagamento para 2026 a 2028, preservando a isenção dos lucros apurados até 2025, na exata medida em que já estejam realizados e disponíveis.
(parte líquida + parte determinável)
Deliberação que combina:
• Um montante líquido já apurado até novembro; e
• Um critério objetivo para o resultado de dezembro, atrelado ao balanço de encerramento (por exemplo, percentual do lucro contábil final, após auditoria).
Aqui, uma parcela é numérica desde já, e outra é “determinável”, sujeita ao fechamento das demonstrações. É uma solução intermediária, que tenta conciliar o texto legal com os limites técnicos do processo contábil.
(100% do lucro do exercício, definido por percentuais)
Deliberação que antecipa, em 2025, a decisão de distribuir 100% do lucro líquido do exercício de 2025, fixando apenas:
• Os percentuais de participação de cada sócio; e
• O período de exigibilidade (pagamentos entre 2026 e 2028).
O valor em reais é integralmente definido apenas quando concluído o balanço de 2025. É a solução de maior alcance econômico, mas também a que mais se distancia da tradição de só deliberar sobre lucros já conhecidos.
4. Recomendação de Natal e Manssur
Entre essas três alternativas, o escritório tem recomendado, como regra geral, a Abordagem Conservadora, por três razões principais:
Trabalha-se apenas com lucros já demonstrados em balancete intermediário robusto, o que reduz sensivelmente a margem de questionamento da Receita Federal.
A Conservadora é a abordagem que melhor dialoga com a crítica técnica do CFC: evita deliberar sobre lucro que ainda não foi efetivamente apurado, respeitando a lógica tradicional de encerramento contábil.
A legislação atual pune a distribuição de “lucros” sem a devida apuração contábil. O art. 61 da Lei nº 8.981/1995 prevê IRRF de 35%, com ajuste da base de cálculo que pode elevar a carga efetiva a quase 50%, quando o pagamento é considerado sem causa ou disfarce de remuneração tributável.
5. Requisitos formais e prazo de 31/12/2025
Seja qual for o modelo adotado, alguns cuidados são essenciais:
• Deliberação formal em 2025
A ata deve ser aprovada até 31/12/2025, preferencialmente com:
• Registro na Junta Comercial (por exemplo, Jucesp); ou
• Assinatura digital com carimbo de data e hora, assegurando prova robusta do momento da deliberação.
• Respeito às premissas societárias clássicas
Continuam plenamente aplicáveis:
• Integridade do patrimônio líquido;
• Manutenção do capital social e das reservas legais e estatutárias;
• Observância de cláusulas contratuais e acordos de acionistas;
• Verificação da disponibilidade de caixa frente aos cronogramas de pagamento.
Esses requisitos não substituem a necessidade de deliberação em 2025 para fins de preservação da isenção, mas condicionam a sua validade e a segurança jurídica do ato.
6. Próximos passos
Seguimos acompanhando:
• A tramitação do PL nº 1.087/2025 no Congresso;
• A posição oficial do Poder Executivo quanto aos vetos sugeridos pelo CFC; e
• Eventuais atos normativos da Receita Federal que venham disciplinar a transição para a tributação mínima e os procedimentos declaratórios.
Enquanto não houver definição final, entendemos que a melhor postura é preparar, desde já, uma estratégia societária e tributária integrada para cada empresa ou grupo econômico, avaliando:
• A estrutura societária;
• O histórico de lucros e reservas;
• O perfil de renda dos sócios e pessoas fisicas envolvidas; e
• Os cenários de tributação a partir de 2026.
A equipe de Natal e Manssur permanece à disposição para apoiar a definição do modelo de deliberação mais adequado em cada caso, bem como a redação das atas societárias necessárias e o alinhamento com a contabilidade e a auditoria externa.