12/02/2021
A recente publicação da Lei nº 14.112/2020 alterou diversos dispositivos da “Lei de Recuperação Judicial” (Lei 11.101/2005) e da “Lei do CADIN” (Lei 10.522/2002), e seus efeitos já começaram a valer a partir de 23/01/2021.
Tendo em vista os importantes impactos na gestão da dívida tributária pelos contribuintes de tributos federais, apresentamos uma síntese das principais alterações:
1. Competência Judicial para Constrição e Bens e Suspensão de Cobranças Tributárias (stay period): Com a nova legislação, o Juízo da Recuperação Judicial passou a ter maior competência e, portanto, maior autonomia no trato das medidas de constrição de bens do devedor ainda que as cobranças estejam sendo feitas em Execuções Fiscais distribuídas a outros Juízos (ex.: Varas das Execuções Fiscais).
Assim, quanto à efetivação das referidas cobranças tributárias, o contribuinte deve se atentar que o regime jurídico das Recuperações Judiciais contempla um período de suspensão das cobranças dos débitos em geral (stay period). Trata-se do período de 180 dias, que começa a contar da data do ajuizamento da ação de Recuperação Judicial, para que o contribuinte possa elaborar o seu plano de recuperação sem ser surpreendido por medidas constritivas de seu patrimônio. Entretanto, não obstante o período de suspensão acima mencionado não atinja os credores extraconcursais e o curso das execuções fiscais[1], qualquer tentativa de constrição do patrimônio do devedor em Recuperação Judicial estará vedada durante o stay period, na medida em que a decisão de suspensão proferida pelo Juízo da Recuperação Judicial é mandatória quanto aos demais processos judiciais[2].
2.Distribuições de Lucros e Dividendos: As recentes alterações também trazem expressa vedação à distribuição de lucros e dividendos aos sócios e acionistas enquanto não aprovado o plano de Recuperação Judicial.
3. Venda de Ativos: Os requerimentos de venda de ativos no Curso da Recuperação Judicial implicarão na necessária intimação dos Fiscos (Federal Estadual ou Municipal) interessados na ação.
4. Necessidade de CND: Quanto à necessidade de apresentação de Certidão Negativa de Débitos – Tributários – CND (ou Positiva com efeitos de Negativa – CPEN) foi mantida a regra do art. 57 da Lei de Recuperação. E para reverter a jurisprudência do STJ que se assentou no sentido da flexibilização dessa regra, houve a regulamentação dos parcelamentos e transações em Recuperações Judiciais por meio da introdução dos artigos 10-A, 10-B e 10-C na Lei nº 14.112/2020. Na prática, isso implicará na efetiva necessidade de apresentação de CND ou CPEN tributárias para efeito de aprovação do plano de Recuperação Judicial[3].
5. Parcelamentos na RJ: Ponto que chama a atenção são as condições beneficiadas para acordos de parcelamento dos débitos tributários das empresas em recuperação judicial, conforme as novas disposições fixadas com a introdução dos artigos 10-A, 10-B e 10-C na Lei 10.522/2022. Vejamos:
(i) parcelamento dos débitos tributários (ou não) existentes perante a Fazenda Nacional, vencidos ou não, inscritos em Dívida Ativa (ou não) até a data do protocolo da inicial da Recuperação Judicial poderão ser parcelados em até 120 prestações mensais, distribuindo-se 0,5% da dívida nas 12 primeiras prestações, 0,6% da dívida da 13ª a 24ª prestações, e o saldo remanescente em 96 parcelas;
(ii) possibilidade de liquidação de até 30% da dívida consolidada referente aos débitos administrados pela Receita Federal por meio da utilização de prejuízo fiscal acumulado de IRPJ e da utilização do saldo negativo de CSLL, e parcelamento do restante em até 84 prestações mensais. Do mesmo modo, a lei prevê o pagamento de 0,5% da dívida das parcelas 1 a 12, e de 0,6% da 13 a 24, com o saldo remanescente quitado nas 60 prestações mensais subsequentes;
(iii) parcelamento de tributos incidentes sobre os ganhos de capital havidos nas alienações de ativos da empresa, desde que comprovada a necessidade dessas alienações para a manutenção das atividades da empresa em recuperação;
(iv) parcelamento em até 24 (vinte e quatro) parcelas mensais e consecutivas de débitos (constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa) referentes a tributos passíveis de retenção na fonte, descontados de terceiros ou sub-rogados, relativos a IOF retido e não recolhido.
6. Fruição dos Parcelamentos. Condições: a fruição desses parcelamentos requer do contribuinte a apresentação de “termo de compromisso” prevendo:
i. o fornecimento à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil e à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional de informações bancárias, incluídas aquelas sobre extratos de fundos ou aplicações financeiras e sobre eventual comprometimento de recebíveis e demais ativos futuros;
ii. o dever de amortizar o saldo devedor do parcelamento de que trata este artigo com percentual do produto de cada alienação de bens e direitos integrantes do ativo não circulante realizada durante o período de vigência do plano de recuperação judicial;
iii. o dever de manter a regularidade fiscal;
iv. o cumprimento regular das obrigações para com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
7. Possibilidade restrita de não inclusão de todos os débitos tributários: Apesar da previsão de necessidade de inclusão da totalidade dos débitos em aberto da empresa, fica ressalvada a possibilidade de excluir os débitos sujeitos a outros parcelamentos ou que comprovadamente sejam objeto de discussão judicial com oferecimento de garantia idônea e suficiente, aceita pela Fazenda Nacional em juízo; ou apresentação de decisão judicial em vigor e eficaz que determine a suspensão de sua exigibilidade.
8. Causas de Revogação dos Parcelamentos: São previstas como causas de exclusão/revogação:
(i) a falta de pagamento de 6 (seis) parcelas consecutivas ou de 9 (nove) parcelas alternadas;
(ii) a falta de pagamento de 1 (uma) até 5 (cinco) parcelas, conforme o caso, se todas as demais estiverem pagas;
(iii) a constatação de qualquer ato tendente ao esvaziamento patrimonial do sujeito passivo como forma de fraudar o cumprimento do parcelamento, a decretação de falência ou extinção, pela liquidação, da pessoa jurídica optante;
(iv) a concessão de medida cautelar fiscal;
(v) declaração de inaptidão da inscrição no CNPJ;
(vi) a extinção sem resolução do mérito ou a não concessão da recuperação judicial, bem como a convolação desta em falência;
(vii) o descumprimento de quaisquer das condições previstas no termo de compromisso.
9. Hipótese de Transação Tributária dos débitos: também são previstas situações excepcionais para a realização de transação tributária com a fixação de prazo aumentado de até 120 meses (84 meses na Lei 13.988/2020) e redução de 70% (em contrapartida a de 50% prevista originalmente), a ser analisada pela Procuradoria de acordo com a sua conveniência, análise da recuperabilidade do crédito, proporção entre passivo fiscal e restante das dívidas da empresa, sem prejuízo do atendimento das condições dispostas no Termo Compromisso exigido para fins de parcelamento.
10. Descumprimento de Parcelamentos e Transações e Requerimento de Falência e Execução de Garantias: Também no bojo das recentes alterações, fica expressamente assegurada a possibilidade do Fisco de requerer a falência do devedor em recuperação Judicial quando este (i) deixar de honrar os parcelamentos fiscais aderidos, (ii) as transações tributárias firmadas ou (iii) se constatar esvaziamento patrimonial que remeta à liquidação da empresa em prejuízo da Fazenda Pública e demais credores. O mencionado esvaziamento patrimonial se caracteriza quando se constata a falta de reserva de bens, direitos ou fluxo de caixa capazes de suportar a manutenção das atividades da empresa.
Além das possibilidades de requerimento de Falência acima apontadas, outras consequências estão previstas ao contribuinte que descumprir os “acordos” com o Fisco, que são:
(i) a exigibilidade imediata da totalidade do débito confessado e ainda não pago, com o prosseguimento das execuções fiscais;
(ii) a execução automática das garantias;
(iii) o restabelecimento em cobrança dos valores liquidados com os créditos de prejuízo fiscal e base negativa de CSLL.
A equipe de Direito Tributário de Natal & Manssur conta com profissionais especializados que podem auxiliar nessas e outras questões.